sexta-feira, 1 de março de 2013

Você jà comeu a Amazônia hoje?

Texto de João Meirelles
João Meirelles vive em Belém, Pará, na região do estuário do rio Amazonas. Trabalha numa entidade sem fins lucrativos, o Instituto Peabiru – http://www.peabiru.org.br e se dedica ao fortalecimento institucional de organizações sem fins lucrativos da Amazônia. É autor do Livro de Ouro da Amazônia (3a edição, Ediouro, Rio de Janeiro 2.004).
Décima geração de pecuaristas que abriram as fronteiras pioneiras do Brasil, deixou de comer carne bovina em 2.000

Você e eu somos bois-de-presépio ou cidadãos do planeta? Você acredita que a sua forma de viver, alimentar-se, comportar-se, construir a sua casa, presentear seus amigos, visitar os lugares ou votar possua relação direta com a Amazônia? Caso afirmativo, você aceitaria avaliar se está comendo ou não a Amazônia? A cada dia as pesquisas científicas e os relatórios ambientalistas são mais taxativos: não podemos nos dar ao luxo de esperar que as pessoas se convençam sobre a gravidade da situação da Amazônia. Será tarde demais quando fazendeiros, garimpeiros, madeireiros, funcionários públicos, representantes do poder público e a população em geral , despertarem para o fato. Teremos perdido a maior parte da Amazônia.

Os fatos

Em cinco séculos 95% das populações indígenas desapareceram. Nações inteiras foram extintas pelas doenças, pela escravidão e pelas armas trazidas pelos europeus. As Nações que sobreviveram, cerca de 180, com mais de 200 mil indivíduos (1% da população da região), contam com poucos aliados entre os funcionários públicos e organizações da sociedade civil para se defenderem de garimpeiros, caçadores, ladrões de madeira e grileiros.
Em termos sociais a Amazônia é uma das regiões de maiores desigualdades econômicas e sociais do planeta. Esta é, de longe, a mais violenta do país, respondendo pela maioria dos casos de morte em conflitos pela terra, número de trabalhadores escravizados em fazendas de pecuária e pela grande insegurança das áreas urbanas. Os 23 milhões de habitantes estão longe de se beneficiar da biodiversidade, da etnodiversidade, de suas riquezas culturais e da produção de madeira e minerais. O IDH (Índice de Desenvolvimento Humano, da ONU) da região equivale ao dos paises mais pobres do planeta.
Em termos ambientais oferecemos, ano apos ano, o maior espetáculo de pirotécnica ao queimarmos mais florestas para virarem pasto. O desmatamento e as queimadas da Amazônia tornam o Brasil um dos principais paises emissores de gases que contribuem para o efeito estufa. As mudanças climáticas são irreversíveis.
Em termos de biodiversidade, em apenas 4% da superfície terrestre a Amazônia continental deve abrigar mais de 1/5 da biodiversidade do planeta. Nas áreas mais comprometidas, como no entorno de Belém, por exemplo, . das aves estão ameaçadas de extinção. Uma vez extinta uma espécie, esta extinção é para sempre.
Em termos ambientais, de 1.500 a 1.964 desmatamos menos de 1% da Amazônia. Nos últimos 40 anos desmatamos cerca de 16% da região. uma área equivalente a duas vezes a Alemanha (ou três estados de São Paulo) em pasto. Esta área de 750 mil km2 é duas vezes maior que a área agrícola do pais. Pior, 1/4 desta área encontra-se abandonada porque o objetivo de derrubar o mato foi o de tomar a posse da terra, para dizer: aqui tem dono.
No momento estamos perdendo cerca de 24 mil km2 de cobertura nativa ao ano. Isto significa que a cada ano estamos desmatando uma área equivalente a 2/3 da Bélgica (ou do estado de Sergipe).
A cada ano perdemos cerca de 1% do que resta da floresta amazônica. Se nada for feito teremos perdido mais da metade da floresta nos próximos 30 anos. Eu não autorizei.



Você autorizou?

Estamos apenas medindo a febre e não combatendo as causas da doença. A febre em um doente alerta que algo vai errado, é apenas um índice. Há grande comoção quando os índices de desmatamento são expostos ao vexame público, e pouco interesse em discutir as verdadeiras razões de seu crescimento.
São os grandes fazendeiros! - apontam uns! É a expansão da soja! - sugerem outros. É a abertura de estradas, a ineficácia e ausência do poder público, o aumento das fazendas, os madeireiros, os garimpos, e assim por diante... Será que não continuamos na periferia do problema? Será que estamos apontando apenas as conseqüências de atos que praticamos em nosso dia-a-dia, de forma relapsa, impensada e, digamos, irresponsável?

Os responsáveis somos nós!

Será que estamos fazendo as perguntas certas? Quem é responsável pela maior parte dos desmatamentos? Não será difícil responder: as propriedades rurais dedicadas à pecuária. Trata-se apenas das grandes fazendas? Não, as pequenas e médias têm na pecuária bovina e bubalina (de búfalos) sua principal atividade.
E por que expande a pecuária na Amazônia? Certamente um fazendeiro tradicional irá comentar: “porque é mais barato produzir carne na região, a terra tem pouco valor, a mão de obra é barata, há pouca fiscalização dos órgãos ambientais, trabalhistas e da receita federal”.
Esta, no entanto é uma resposta insatisfatória. Afinal, esta carne vai para algum lugar. Alguém consome este produto. Os dados são claros: mais de noventa por cento da carne produzida na Amazônia é consumida no próprio Brasil, a maior parte nas regiões de maior poder econômico – Sul e Sudeste. O crescimento do consumo de carne bovina é significativo. A cada dia mais e mais pessoas querem a sua picanhazinha e a sua maminha.
Em quarenta anos, de 1964 a 2004, o rebanho bovino da Amazônia saltou de 1,5 para 60 milhões de cabeças. Parte deste rebanho é clandestino. Este lote de animais prontos para morrer para saciar o desejo de comer carne bovina representa 1/3 do rebanho brasileiro. Três cabeças de boi para cada habitante da Amazônia. No Brasil já há mais bois que gente!
A pecuária é a principal atividade econômica rural da Amazônia. Não se trata apenas de grandes e médios propriedades (estes são 25 mil famílias com áreas acima de 500 hectares). A maior parte dos 400 mil pequenos proprietários rurais da Amazônia tem na pecuária a sua principal fonte de renda (seja pelo fracasso das demais atividades econômicas, seja pela completa incompreensão do que seja a natureza amazônica ou impaciência com a Natureza, preferindo carboniza-la a conduzir a dança da sustentabilidade).
Lembremos que estamos em um país onde a maioria vive em grande carestia. Se não fosse devido o baixo poder aquisitivo do brasileiro o consumo de carne seria pelo menos o dobro. O brasileiro come, em média, um bife pequeno por dia (100 gramas) - 36 kg de carne/ano.
Um boi de 16 arrobas tem em média 240 kg de carne. Se você comer carne bovina durante sua vida (72 anos – a idade média do brasileiro), isto significa um boi a cada 6,6 anos, 11 bois inteiros durante a vida2,6 toneladas de carne! Destes 11 bois, pelo menos 4 terão vindo da Amazônia, ou seja, a cada três dias o brasileiro come um bife da Amazônia.
Sabe-se que este é um índice médio. O consumidor da classe alta e média chegam a comer mais de 3 vezes esta cifra - 108 kg/carne bovina/ano. Ou seja, um caminhão com 32 bois, mais de 7,5 toneladas de carne em sua vida!
Leia texto completo no site: http://www.xamanismo.com.br/Consciencia/SubConsciencia1191924936It008

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