A Rio+20 vai
reunir líderes de todo o mundo para tratar do clima — mas dá para esperar
resultados?
Quando aconteceu a Rio-92, o encontro de cúpula
organizado pela ONU para discutir o então relativamente novo tema do
desenvolvimento sustentável, o presidente do Brasil era Fernando Collor de
Mello, o cruzeiro ainda era a moeda nacional, a abertura econômica chinesa
estava apenas começando a mostrar resultados e a ideia de que a temperatura da
Terra pudesse estar aumentando perigosamente estava essencialmente restrita ao
mundo acadêmico. Em 2012, urna nova leva de lideranças mundiais estará no Rio
de Janeiro para avaliar os progressos — ou a falta deles — nas duas décadas que
se passaram desde o evento original. O Brasil e o mundo mudaram muito, mas no
que diz respeito às discussões sobre o clima a mudança que estará em pauta é
outra, bem mais recente: será que o ímpeto dos esforços por uma agenda global
está arrefecendo? A expectativa para a reunião de Copenhague, dois anos atrás,
era grande, mas o encontro acabou sem resultados importantes. Com a perspectiva
de uma prolongada crise econômica dominando a agenda dos governantes, e diante
das dificuldades em conseguir um equilíbrio entre ricos, emergentes e pobres
quando o assunto envolve o desenvolvimento, o temor é que o evento no Rio dê em
muito pouco, a exemplo do que aconteceu na Dinamarca.
Muito terá a ver com o ponto de vista do observador. Em meados de dezembro. em Durban, na África do Sul, depois de duas semanas de intenso vaivém, os representantes de quase 200 países concordaram com um plano que vai substituir o Protocolo de Kvoto. O acordo firmado no Japão em 1997 criou obrigações para 40 países limitarem suas emissões de dióxido de carbono. Agora se chegou a um consenso para que todos reduzam suas emissões, incluindo China, índia e Estados Unidos, três dos maiores responsáveis pelo despejo de CO, na atmosfera. Os negociadores proclamaram o resultado corno um sucesso histórico, o avanço mais relevante em mais de urna década de negociações. Mas os mais pessimistas, que gostam de se considerar realistas, apontam que ainda não-há detalhes sobre o montante dos cortes nas emissões, muito menos uma data para que elas entrem em vigor. Estima-se que os números só sejam acordados em 2015 e o pacto comece a valer em 2020.
As
comemorações são "nonsense", diz Michael Levi, pesquisador
especializado em energia do instituto Council of Foreign Relations. Levi
aponta que, apesar das declarações oficiais, não há garantias de que o pacto
obrigue legalmente os signatários a reduzir as emissões.
Mais
importante que as datas, porém, é a questão do termômetro. Nada do que foi
discutido na África do Sul muda as previsões de que, até o fim do século, a temperatura
do planeta esteja 3,5 graus mais alta. Isso é muito mais que os 2 graus
geralmente considerados o limite máximo aceitável do aquecimento global. Em
2100. quando as futuras gerações estiverem estudando história, certamente um
dos temas será o que foi feito — ou o que não foi feito — para evitar mudanças
potencialmente catastróficas no clima no começo do século 21. É nesse cenário
que a reunião do Rio vai acontecer. Como costuma ocorrer em eventos com
presidentes e primeiros-ministros, o encontro vai ter mais pompa do que
conteúdo prático — bem, talvez nem tanta pompa assim: em novembro o evento
mudou de data porque coincidiria com a celebração dos 60 anos da coroação de
Elizabeth II no Reino Unido.
Espera-se
uma declaração conjunta dos participantes, possivelmente com menção a um órgão
mundial que centralize as questões ligadas ao meio ambiente. Hoje, os mais de
500 acordos multilaterais que dizem respeito ao assunto estão espalhados por
várias agências das Nações Unidas. A ideia é criar algo semelhante à
Organização Mundial do Comércio.
Outro tema
importante será a transição para a economia verde.
Um
dos objetivos da Rio+20 é tratar do tema da sustentabilidade não apenas do
ponto de vista ambiental. Uma das ideias que devem ter ênfase é a de atribuir
valores financeiros para os bens da natureza. Também se discutirá o estímulo à
inovação tecnológica como meio de geração de crescimento econômico e de
produtos e serviços sustentáveis. Esse reenquadramento mais orientado à
tecnologia e à denominação monetária dos recursos naturais, embora apoiado
pelos governos, deve gerar controvérsias. Numa das reuniões preparatórias para
a cúpula, realizada no início de 2011 em Nova York, o embaixador boliviano nos
Estados Unidos, Pablo Sakm, resumiu a crítica essencial a essa nova
"missão" que deve ser acordada no Rio. Para Salon. o "capitalismo
verde" seria apenas uma camada de tinta, incapaz de resolver os problemas
de pobreza e injustiça. Segundo essa linha critica, a ideia de sustentabilidade
estaria sendo desvirtuada. "Essa 'economia verde' nada mais é que um
cavalo de Troia para que a destruição continue acontecendo". escreveu o
comentarista Jim Thomas, ligado ao movimento ambiental.
Apesar
da oposição, de uma parcela do movimento ambientalista, é certo que as
lideranças mundiais façam um esforço para aproximar ainda mais o assunto do
terreno econômico. O problema é de outra natureza: nestes tempos turbulentos,
com urna crise que se arrasta há mais de três anos, quaisquer declarações sobre
o assunto, mesmo que sinceras, correm o risco de não ecoar por muito tempo
depois de fotografias e apertos de mão.
Fonte: Revista Exame,
Ano 45, N. 25 de 28.12.2011 (www.exame.com)
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